Essa é uma dúvida que tem intrigado a população brasileira. Ainda pior quando o cidadão é surpreendido ao receber uma autuação da Receita Federal por desconhecer do assunto.
Porém, até mesmo para advogados e contadores o tema é controverso, e isso reflete exatamente como nosso Poder Judiciário tem se pronunciado sobre o tema.
Como isso prejudica os contribuintes?
Para melhor compreensão, invistamos um pouco de tempo para entender a problemática:
No Brasil, quando do recebimento de uma herança ou então de uma doação, é devido o recolhimento de imposto denominado ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis ou Doação), o qual tem um percentual variável de acordo com cada estado brasileiro, podendo ser de 2% a 8%, dependendo da região e de critérios criados pela receita estadual.
Por outro lado, é devido IR (Imposto de Renda) sempre que a pessoa tenha ganho de capital com a valorização de um imóvel.
O problema surge quando alguém recebe um imóvel por herança que estava com uma avaliação antiga e defasada na declaração do falecido e o declara com o valor atualizado em sua declaração. A Receita Federal entende que houve o chamado “ganho de capital” e que, portanto, é devido o recolhimento de IR sob o valor desta diferença que o herdeiro estaria sendo beneficiado.
Contudo, a situação gera uma bitributação, vez que já foi recolhido o ITCMD justamente para a transferência da propriedade do imóvel.
Como a questão tem sido tratada?
A questão já foi analisada pelo Poder Judiciário e as decisões são conflitantes. Ora se reconhece a validade da cobrança do IR, ora não.
O próprio STF (Supremo Tribunal Federal) possui entendimento diverso dentro de suas próprias Turmas.
Em fevereiro de 2023, a 1ª Turma proferiu decisão na qual reconheceu a não incidência de IR sobre suposto ganho de capital no caso de recebimento de bens por herança cuja avaliação estava defasada antes da transmissão do bem (ARE 1387761)[1].
Em agosto de 2023, a mesma 1ª Turma permitiu que fosse cobrado o IR (RE 1437588)[2].
Na 2ª Turma, também há divergência de posicionamentos. Em março de 2023 entenderam que não poderiam reanalisar o mérito do recurso e mantiveram uma decisão do Tribunal Regional que havia entendido pela inexistência de ganho de capital (RE 943075)[3].
Já em fevereiro de 2021, a mesma 2ª Turma proferiu entendimento de que a União poderia cobrar IR no caso de recebimento de imóvel valorizado por herança, por se tratar de momentos e fatos geradores distintos (RE 1269201)[4].
Evidentemente, a questão carece de uma uniformização de entendimento, a fim de que se possa trazer segurança jurídica ao contribuinte que recebe um bem como herança ou doação e precisa saber tudo o que deve (ou não) ser recolhido a título de impostos.
Vale lembrar que o não pagamento (não declaração) pode ocasionar fiscalização (malha fina) com aplicação de multas e demais penalidades.
E o que pode ser feito?
A manutenção do valor antigo na declaração de imposto de renda de quem recebe a herança pode, num primeiro momento, evitar a incidência do IR. Todavia, pode gerar outros problemas, principalmente no caso de futura venda do imóvel – quando de fato será devido IR e o ganho de capital será elevado em razão da não atualização no recebimento do imóvel.
É necessária a análise e planejamento de cada circunstância, sendo, inclusive, avaliada a viabilidade da interposição de medidas judiciais para declaração de não incidência do IR, a depender da localização e valor dos bens objeto da herança ou doação.
Escrito por Felipe Rangel (OAB/PR 65.292).
[1] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6422025
[2] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6643982
[3] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6643982
[4] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5916829